segunda-feira, 11 de maio de 2009

Síntese do V livro da obra Ética a Nicômaco de Aristóteles




Charles Fernando Gomes

1। Introdução
Luc Ferry
Como viver? É a questão principal, pois contém todas as demais. Como viver de uma maneira feliz, mais sensata, mais livre? No mundo tal como é, já que não temos opção. Na época que é nossa, já que todas dependem dela. Para transformar o mundo? Para se transformar? Ambos. Um pel
o outro. A ação é o caminho. Mas que só vale pelo pensamento que a ilumina. O máximo de felicidade no máximo de lucidez: é o que os antigos chamavam sabedoria, que dava sentido a filosofia e à vida deles. Mas a sabedoria deles não é nossa. Ou, antes, a nossa não poderia reproduzir, pura e simplesmente a deles. O mundo não é o mesmo. A sociedade não é a mesma. As ciências, a moral, a política. Como poderíamos ter a mesma vida, a mesma maneira de nos salvar ou nos perder? (COMTE, 1999, p. 05) Se quisermos reatar como o ideal antigo de saberia, foi menos por nostalgia do que por impaciência. A vida é breve demais, preciosa demais, difícil demais, para que nos resignemos a vivê-la de qualquer jeito. E interessante demais para não nos darmos tempo de refletir a seu respeito e debatê-la. Como viver? Se a filosofia não responder a essa questão, para que a filosofia? (COMTE, 1999, p. 06) Talvez, o leitor desta síntese possa se perguntar aonde que cabe a reflexão de um filósofo moderno no sentido maior que postula a obra supracitada de Aristóteles, porém cabe uma observação mais minuciosa e atenta para fazer conexões que posteriormente na discussão sobre o a obra e na conclusão se tornarão mais claras.. A obra Ética a Nicômaco é composta por dez livros. O título indica o assunto, que é a ética. A obra designa as concepções morais nas quais o homem possui fé. Segundo o autor, o único objeto que o homem persegue é o bem, seja lá o que ele for ou faça, mesmo que pareça orientado para fins imperfeitos, mas o que ele tem em vista, em última instância, é o bem supremo, fim absoluto, buscado por si mesmo. A felicidade é da alçada da ética coletiva e da política, segundo Aristóteles. Sua filosofia é primordialmente dedicada às virtudes humanas e sua prática. O principal objetivo desta síntese será o quinto livro da obra Ética a Nicômaco। Trabalharemos como tema principal a justiça e seu universo de relações, relações estas que o filósofo grego debruçou após a formulação de seus quatro livros anteriores, que ele objetivamente estudara como núcleo: a ética, o bem, a felicidade e a virtude.

2। Livro quinto da obra Ética a Nicômaco

No que diz respeito à justiça e à injustiça devemos indagar com que espécie de ações se relacionam elas, que espécie de meio-termo é a justiça, e entre que extremos o ato justo é meio-termo. Nossa investigação se desenvolverá dentro da mesma linha que as discussões anteriores (ARISTÓTELES, 2004, p.103). Na introdução do quinto livro, Aristóteles já apresenta claramente o caminho que ele deseja e irá trilhar na obra, que é a relação entre a justiça, o ato de justiça e as relações da justiça. Para Aristóteles, “a justiça não é uma parte da virtude, mas a virtude inteira”. A justiça como o arquétipo da virtude inteira nos conduz a compreender nas entrelinhas, que o filósofo esta falando do universo espiritual da polis, da relação dos cidadãos e essencialmente do que é importante e indispensável para o bem-viver e a harmonia da sociedade. A justiça, enaltecida por ele, corresponde à predileção do sujeito justo que é um legítimo probo, um ser proporcional e inviolável a lei, poderíamos dizer em termos modernos, homem que não se corrompe. Mas, quem seria o homem justo e o injusto para Aristóteles? Diferentemente do homem justo, o homem injusto é ímprobo e iníquo. Porém o foco desta questão é o ato justo e injusto. Aristóteles afirma: “Sendo os atos justos e injustos aqueles que descrevemos, um homem age de maneira justa ou injusta sempre que pratica tais atos voluntariamente. Quando os pratica involuntariamente, ele não age nem injusta nem justamente, a não ser por acidente (ou seja, fazendo coisas que resultam em justiças ou injustiças). E o que determina um ato justo ou injusto é o caráter voluntário ou involuntário do ato (ARISTÓTELES, 2004, p.118-119). O filósofo grego esta discutindo particularmente a intencionalidade do ato, discussão esta que perpassa todo o mundo grego antigo e caminha até os arredores do medievo e permeia as mais conflituosas questões antropológicas e teológicas da modernidade e da atualidade. Como julgar um ato rotulando-o como justo ou injusto? Aristóteles levanta um imenso problema para refletirmos, pois, temas como vontade, escolha, lei e obediência circulam no universo da justiça e nos levam a investigar a natureza da justiça e de seu ato, a validade e a constituição do ato de um indivíduo e por fim o teor qualitativo, quantitativo e a causalidade que orienta determinado ato. Aristóteles trabalha a equidade e o equitativo e suas relações como a justiça e o justo respectivamente, e contribui afirmando que “a justiça e a equidade não parecem absolutamente idênticas, nem ser especificamente diferentes. Às vezes louvamos o que é equitativo e o homem equitativo (e até aplicamos esse termo a guisa de louvor, mesmo em relação a outras virtudes, querendo significar com “mais equitativo” que uma coisa é melhor); e às vezes, pensando bem, nos parece estranho que o equitativo, apesar de não se identificar como o justo, seja ainda assim digno de louvor; de fato, se o justo e o equitativo são diferentes, um deles não é bom, mas se são bons, hão de ser a mesma coisa (...). Por isso o equitativo é justo e superior a uma espécie de justiça, embora não seja superior à justiça absoluta, e sim ao erro decorrente do caráter absoluto da disposição legal” (ARISTÓTELES, 2004, p. 124-125). Por fim, Aristóteles esta alicerçado nas balisas da justiça que deve pautar e organizar as relações humanas de uma forma moral e virtuosa। Nem sempre o justo é o melhor para a justiça, como nem sempre a lei é o melhor para a legalidade, mas compreende o filósofo grego, nas relações de justiça e de injustiça no homem, que apesar de “metafórico e em razão de certa analogia, há uma espécie de justiça no homem, não em relação a ele mesmo, mas entre certas partes suas”. Para Aristóteles as “relações que a parte racional da alma guarda para com a parte irracional são desse tipo, e é tendo em vista essas partes que se pensa que o homem possa ser injusto para consigo mesmo, porque tais partes podem sofrer alguma coisa contrária aos seus desejos, de tal modo que parece haver uma justiça entre elas, como aquela que existe entre governante e governado” (ARISTÓTELES, 2004, p. 127).

3। Conclusão

Somos nossa história? Esta pergunta é resultado de um debate entre André Comte e Luc Ferry, presente no primeiro capítulo do livro Sabedora dos Modernos. Acredito que o leitor talvez não faça de imediato uma relação entre a obra moderna citada e a grega trabalhada acima, mas podemos iniciar uma interessante conclusão para esta síntese. Aristóteles apresenta a justiça, como um autêntico grego, algo inerente ao homem, algo que se encontra presente na natureza humana. O homem como um animal político e lógico, é possuidor de conhecimentos dos quais almeja desvelar, aprimorar e utilizar na construção e bem viver da polis. A justiça como a mais completa das virtudes, segundo o filósofo, comporta a solução para as mais diversas necessidades da cidade e de seus cidadãos. Detentora por excelência dos bons comportamentos, das escolhas e vontades e norteadora das ações, além de possuir um caráter inteiramente moral e legal, o que assegura a harmonia da cidade. André Comte e Luc Ferry, diferente de Aristóteles estão numa batalha entre dois campos bem opostos de idéias, isto é de um lado um humanista e de outro lado um materialista, o que ocasiona duas visões de mundo e de homem diferentes se debatendo e buscando um denominador comum que possibilite um diálogo entre esses dois pólos convergentes. Daí que eu convido Aristóteles a fazer parte desta discussão que não é apenas dos dois filósofos citados, mas é essencialmente nossa. Na filosofia da vida, todos somos convidados a entender a importância de se pensar no nosso modo de vida e dele fazer filosofia. Mas, e a ética e a justiça Aristotélica? Bem, esta se estabelece como o medianeira na discussão, pois, em qualquer âmbito do confronto moderno ela é sutil e acima de tudo prática, possuidora da teoria e da forma de utilizá-la na prática. Por fim, concluo que Aristóteles é a alta figura da modernidade em se tratando de ética, justiça e virtude। O filósofo não pergunta se nos somos nossa história, mas nos impulsiona a fazer história na estória, sei que seu impulso contém bula, indicações e até contra indicações, mas em se tratando de humanismo e materialismo é bem mais radical, pois propõe uma atitude legal, moral, intencional e acima de tudo responsável, pois a intencionalidade da atitude e suas conseqüências envolvem outros humanos também.

4. Referência

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Trad. Pietro Nassetti. Martin Claret: São Paulo, 2004. COMTE-Sponville, André. A sabedoria dos modernos: dez questões para o nosso tempo/ André Comte-Sponville, Luc Ferry: tradução Eduardo Brandão- São Paulo: Martins Fontes, 1999.

2 comentários:

Anônimo disse...

Ótimo. Adorei seu resumo sobre o Quinto livro de Aristóteles.

Unknown disse...

Muito bom!