segunda-feira, 13 de julho de 2009

Do giro lingüístico até Foucault

Do giro lingüístico até Foucault

[1]Charles Fernando Gomes

A centralidade no signo da linguagem e suas funções (sintática, semântica, pragmática e hermenêutica) é a base do giro lingüístico (ou virada lingüística) que ocorreu nos séculos XIX e XX. A linguagem constitui o mundo, forma o mundo que é construído, por isso não é mais teoria do conhecimento (conhecimento dado), mas epistemologia (conhecimento construído). A fala une, alia e junto às realidades.

As funções da linguagem são: Sintaxe, a linguagem formal, pura sem contradições e nem interpretação, como a linguagem cientifica. Semântica, a linguagem formal empírico, concepção cientifica (ciência), certeza e precisão. Pragmática, uso, utilização ordinária da linguagem, comunidade. Hermenêutica, sentido, interpretação (metáfora, poesia).

O termo giro lingüístico foi elaborado por Rorty. Foi Rorty que realizou a junção da filosofia da linguagem de tradição Analítica (EUA, Inglaterra e o Círculo de Viena) que integra os filósofos Wittgenstein I, Russel, Frege, Carnap, Ryle e Searle e da tradição Continental (França e Alemanha) que integra os filósofos Heidegger, Habermas e Foucault e a partir de 1950 os filósofos da mente Austin, Putnam e Davidson.

A tradição Analítica defende o uso da linguagem lógica e matemática, que expresse certeza, exatidão e ordenação o que defere da tradição continental que defende o uso da linguagem hermenêutica, isto é, a exegese, a analise dos significados, símbolos e signos. A investigação da historia e a analise do homem que se insere no contexto desta história (formação de intersubjetividade e estudo das comunidades).

A preocupação filosófica que se encontrava na consciência com os filósofos modernos (Descartes), passa para a linguagem e suas específicas funções, pois ela (a linguagem) possibilita a relação sujeito e objeto, descreve o mundo e seus fatos e predomina em todas as instâncias da existência (o homem pensa e pensamento é linguagem) humana.

A filosofia da linguagem, no viés analítico, possui como precursores os filósofos Frege, Quine e Russel. Esta tríade é que deu o pontapé inicial a filosofia analítica. Na proposta de Frege está uma ideografia cuja função seria justamente corrigir a inadequação no que diz respeito à expressão da verdade cientifica. Para ele nós nascemos e aprendemos à linguagem natural, isto é, nossos sentidos, emoções e imaginações (nossa vida mental), e o mundo corrompe a linguagem natural, por isso é preciso purificar a linguagem natural, ou seja, descreve-lo de forma lógica e formal.

No projeto de Quine está vinculado o conceito empirista, ele afirma que o material de nosso conhecimento é fornecido por estimulações sociais e a mediação da linguagem é nossa proposição e só há modificação no interior de nossa linguagem ou na teoria. A cor azul existe? Para Quine, ela não possui significado, mas é significativa, pois, existe algo que se refere ao azul e não o azul, pois, existem azuis e não o azul.

Para Russel, a filosofia é como uma terapia, uma atividade de clarificação lógica da linguagem. Parte da distinção entre a forma lógica e a forma superficial das expressões lingüísticas, desconfia da linguagem natural como geradora de equívocos e acredita que a analise lógica será capaz de esclarecer esses equívocos. Russel é metafísico e postula o atomismo lógico, tem um fundamento lógico que podemos chamar de pluralismo ontológico.

Carnap propõe uma linguagem formal que nela só se falaria de enunciados, sentenças e seus significados, de nexos definitórios entre expressões e relações de dedutibilidade entre sentenças. A tradução numa linguagem formal cita os erros e impressões da linguagem natural, bem como reduz a questão filosófica a problemas epistemológicos, já que a metafísica é desprovida de sentido empírico, e, portanto, desprovida de qualquer sentido. A tarefa da epistemologia, segundo Carnap, é a de justificar como um conhecimento é um conhecimento autêntico.

Ryle se preocupou com o exame e uso dos conceitos da linguagem ordinária e se prestou a resolver uma série de problemas que aparecem em forma de dilema. De acordo com as leis do jogo lingüístico pode-se informar ou negar um enunciado e suas sentenças. Existem três classes de sentenças: as teóricas “se - então”, as hipotéticas práticas “portanto” e as explicativas “porque”. De acordo como utilizamos as palavras em uma sentença pode ser considerada falsa, verdadeira ou questionável. Assim sendo a utilização de palavras como “enunciados, preposições ou juízos” que podem funcionar como premissa ou como conclusão de um enunciado, que é verdadeiro ou falso.

A filosofia pré wittgensteiriana analisa a verdade e a falsidade do que se fala no mundo Realiza a análise textual, semântica, sintaxe e as condições de validade do texto do mundo. Com Wittgenstein, a prerrogativa coloca o sujeito falante dentro do texto e analisa a fala do sujeito que faz uso da linguagem. A investigação passa do texto para o contexto que esta inserida dentro de um jogo que segue regras. Aquilo que é jogo de linguagem em Wittgenstein e ato de fala em Austin, a performance do sujeito nos atos de fala, performance de quando o ato de falar é o que e quando o ato de alguém é falar.

Austin irá dizer que eu posso entrar no mundo de duas formas, que são: constatativo e performativo, a constatação com atuação é que dará veracidade ou falsidade do texto. Agora tudo é linguagem que se insere no contexto. Os atos de fala estão divididos em: locucionário (emitir fala), ilocucionário (expressão) e perlocucionário (força do dizer, ação e persuasão).

Searle investiga a linguagem partindo de seu cotidiano ordinário, de sua formulação enunciativa em atos de fala. Com as especulações sobre a linguagem ele ajunta também a da mente. A preocupação de Searle é fazer uma conjugação da existência do cérebro, da linguagem e da sociedade, a fim de entender a produção interna da consciência. Ele inicia seus estudos com a pergunta: Como as palavras se relacionam com o mundo?

As frases são instrumentos do falante para expressar uma realidade, devido ao significado do falante ainda ser uma forma primária de significado lingüístico. Significado é uma forma de intencionalidade no interior de um emissor e é transferido em palavras. O limite da significação é o limite da intencionalidade. A comunicação tem por finalidade de levar o entendimento desejado pelo falante. A fala é uma emissão de som produzida por um processo biológico, mas que adquire uma semântica de proporções variadas. Um ato de fala requer certo tipo de comportamento e um uso e situação.

Assim, Searle postula a redescoberta da mente, a linguagem como prerrogativa do cérebro, porém de que é municiado o cérebro? Da linguagem. Mas de onde provêm à linguagem? Da sociedade. Segundo Searle há cinco tipos de finalidades ilocucionárias: assertiva, diretiva, compromissiva, expressiva e declarativa[2].

Rorty almeja colocar a filosofia na trilha da redescrição e resignificação, dar novos significados e descrições a filosofia. Utiliza-se da metáfora e da redescrição. Ele transpôs a barreira da pura pragmática e entra também na linguagem hermenêutica, unificando assim duas tradições (analítica e continental).

O que é importante é a idéia de metáfora e dos processos de redescrição ou redefinição da realidade das mesmas coisas. O mundo não muda, estamos redesenhando as mesmas coisas, pois a realidade é sempre a mesma e a riqueza do ser humano esta na capacidade de resignificar o mundo.

Putnam trabalha com a realidade e o relativismo no uso da linguagem. Para o filósofo as línguas humanas são possíveis pelo realismo interno do cérebro, donde não há critério de verdade devido a ela ser relativa e subjetiva. Davidson assume a linguagem e sua veracidade como um ato de crença, quase uma atitude religiosa diante da fala do sujeito, isto é, você precisa acreditar no que discursam, sendo um ato metafísico.

Para Heidegger a linguagem é local aonde o ser se revela, a linguagem como possibilidade de fundamentação do real. Fazer a experiência da linguagem originária e não da objetivizada. Heidegger afirma que os metafísicos no passado não conseguiam dar conta do mundo e do homem. Sua preocupação é o ser, dasein (o ser aí), a poesia é capaz de dizer o mundo, pois a linguagem poética capta o fluir e o movimento das coisas. O ser permite a existência do ente, mas nunca será ente, e definir o ser é torná-lo ente. Neste mecanismo o poeta e o pensador falam do ser e do nada, pois a poesia possibilita a linguagem.

Habermas critica o cientificismo e o tecnicismo. Suas idéias fundamentais são a teoria comunicativa, a defesas da existência (esfera pública) e as ciências naturais e humanas. Para Habermas há uma força emancipatória (na modernidade), uma força produzida por ela mesma, é a razão comunicativa, ou seja, o paradigma da intersubjetividade.

Racionalidade comunicativa, isto é, interação, intersubjetividade dos falantes (atos de fala: conteúdo proposicional, conteúdo normativo e conteúdo pessoal). A ação ajusta-se ao mundo, seleciona algo do mundo, e nisso é orientada por pretensões de validez criticáveis. O mundo se relaciona com o sistema numa “forma de vida“ que encaminhe ao entendimento.

Validade e verdade. Para validar depende de uma pragmática intersubjetiva e não de uma ontologia, pois, a linguagem se constitui como meio para interação social. Para falar não é necessário uma autoridade, um referencial externo ou superior para que eu possa me comunicar, pois, toda comunidade é mundo da vida e sistema. A linguagem norteia a relação do sujeito.

Foucault utiliza-se da linguagem como análise constitutiva do discurso. Falar é criar uma situação, é investir a fala como prática entre outras práticas e a inovação em Foucault esta em interrogar o gesto enigmático que existe nos discursos de verdade, porém o que há de tão perigoso? Ele responde que a sociedade produz discursos de desejo e poder e nestes insere-se discursos de verdade, sistemas de exclusão e formas de conhecer e saber.

Foucault realiza a análise dos procedimentos de controle e de delimitação do discurso (procedimento interno). Os princípios de inversão (reconhecer a negatividade do discurso), descontinuidade (discurso com prática descontínua), especificidade (discurso com violência às coisas) e exterioridade.

Por fim, o problema da referência se determina segundo Foucault, através não somente de uma relação a um objeto, mas sim a toda estrutura que impregna o modo de pensar tal objeto, e que determinam o que este é naquele dado momento histórico, sendo assim o objeto não constituído como algo em si, mas sim o fruto de uma série de enunciados. Assim a linguagem ou as práticas discursivas se arvoram de punição, vigilância, domínio, poder, detenção, controle e verdades, sejam estas, disciplinares do corpo (biopoder), religiosas, científicas, políticas e institucionais (macro poderes e micro poderes).

Referências

ARAÚJO, I. L. Do signo ao discurso: introdução à filosofia da linguagem. 2. ed. São Paulo: Parábola, 2008. v. 1. 279 p.

ARAÚJO, I. L. Introdução à Filosofia da Ciência. 3. ed. Curitiba: Ed. UFPR, 2003. v. 1. 232 p.


[1] Graduando em Filosofia pela PUCPR.

[2] Assertiva: condição preparatória que o falante tem razões ou evidencia do conteúdo proposicional. Condição de sinceridade: que o falante creia no conteúdo proposicional. Exemplos: afirmar, argumentar, informar, testemunhar;

Diretiva: Ordens expressas, linguisticamente por imperativos; condição: representar ação lingüística do ouvinte. Condição preparatória, que o ouvinte seja capaz de levar a cabo a ação. Condição de sinceridade, o falante deseja que o ouvinte leve a cabo a ação. Exemplos: pedir, ordenar, sugerir, solicitar, recomendar;

Compromissiva: Condição: que o conteúdo proposicional se refira a uma ação futura do falante. Condição de sinceridade que tenha intenção de fazê-los. Exemplo: prometer, ameaçar, aceitar, garantir;

Declarativa: O conteúdo proposicional apresenta uma ação atual do falante: Condição preparatória: o falante deve ser crer que é capaz de realizar essa ação com a sua enunciação. Condição de sinceridade. O falante deve crer que é capaz de realizar a ação e desejar realiza-la. Exemplo: declarar, excomungar, batizar, nomear;

Expressiva: é sempre função de um estado psicológico particular. É linguisticamente expressa por exclamativos. Exemplos: agradecer, felicitar, deplorar.

2 comentários:

Luana disse...

Adorei seu Blog ;)

fra. Charles Fernando disse...

obrigado, espero sua visita sempre.....

um imenso abraço, com carinho Charles